Por prazer, serei o que quero, mesmo
que o meu desejo são não seja. Pois minha vontade é a lei, embora a lei birra
seja. Serei não por mim o que quero, mas por todos os que de mim não querem.
Pois minha vontade é a lei, embora a lei birra seja. Faço das palavras do mais perverso dos homens o meu alicerce, não
porque planejo segui-lo em ideologia, crença ou prática, mas porque minha lei
ordena e somente a ela devo obedecer. Subverterei suas palavras e dobrarei a
natureza da perversidade para os meus objetivos, sonhos e vinganças – subverterei
a natureza de sua perversidade para a minha lei, embora mesquinha minha lei
seja.
Por um nome ou por um coro deles,
serei o que quero, mesmo que minha imagem pacífica não seja. Pois minha vontade
é a lei, embora retaliação a lei seja. Serei por todos tudo o que não querem de
mim: imaturo, fiel impulsivo, guerreiro, odioso, pútrido sincero, colérico,
arauto da discórdia, amante da guerra e espectador da glória. Abrirei portas
para a fúria, soltarei as amarras dos cães – deixarei que contra os falsos
castos ladram e que os fiéis pecadores mordam. Pois minha vontade é a lei,
embora a lei pagamento seja. Serei para os aliados tão perverso quanto o homem
que subverto, pois nem a ele obedeço. Pois minha vontade é a lei, embora pessoal
a lei seja.
Por orgulho serei o que quero, mesmo
que vilanesco meu âmago não seja. Pois minha vontade é a lei, embora desagravo
a lei seja. Serei pela imemorial história um falador, arauto da fissura e
carrasco do rancor. Afogarei com deleite as inimizades e degolarei sem temor as
amizades. Para os amores irei mais fundo: cuspirei, amassarei e devorarei, para
eles minha lei do revide ferrenha será – pois cada fato lembrado é um ato
constante vivido, ressurgido e não aglutinado.
Por cada risada, deboche constante ou
trocadilho corriqueiro, serei o que quero, mesmo que justificada minha vingança
não seja. Serei não o que em mim escondido dormia, mas o que de escarlate eu já
invocava: serei irritante, retrógrado, carrancudo, insuportável perseguidor e austero
egoísta, destruidor das boas novas e arauto do caos. Serei inteligência
suprema, arrogância desmedida, serei ego invencível, senhorial incorrigível e
íntegro perfeito. Serei cinza e negro, a supremacia pessimista; serei assassino
tenro, profanador niilista. Serei conservador desnecessário, cômico misógino; serei
maldito emissário, agressivo misantrópico. Serei odioso e odiado, serei
perseguido e evitado. Serei esmagador de açougueiros, inimigo das putas; serei matador
de abutres e de existências fajutas. Serei carrasco dos burros, caçador dos
hipócritas; serei piadista solene das misérias incautas. Serei tudo o que
deplorou as amadas: mentiroso amável e agressor das curvas, corretíssimo ser
humano e ignóbil compreensível; olhador torto, juiz seletivo. Serei nas bocas
falado, serei nas bocas mal definido. Serei para sempre culpado, serei
constante ferido. Serei mentira e verdade – sobretudo
a verdade. Serei de mim o que nunca delirei nem nas noites mais sombrias,
serei de mim o que por séculos combati em vida carcomida. Serei demônio e
Diabo. Serei anjo e Deus. Serei certo e
errado, serei ira divina.
Pois minha vontade é a lei, embora a
lei derradeiro ódio seja.
Pois minha vontade é a lei, embora a
lei distorcida seja.
Pois minha vontade é a lei e nem o
mais perverso dos homens há de negar.