28 de maio de 2014

Café na madrugada



Esse é mais um amontado de palavras com um título que pouco condiz, sabe? Aqueles textos com títulos inusitados que te levam a crer em uma coisa, mas que contam outra totalmente diferente? Pois é. E aqui vamos nós: porque estas palavras não são sobre uma xícara de café, não são sobre o aroma da cafeína ondulando pela cozinha e tomando conta da casa, não são sobre esmagar o sono com trabalhos intensos e leituras obrigatórias tediosas. Não, meu amor. Estas palavras são puramente metalinguísticas, porque elas são sobre você e sobre o meu fracasso. Não são ladainhas melódicas ou melodramáticas, são a respeito do quanto eu paro para pensar e vejo o quanto fracassei com você, com nós. Foi aqui que uma simples xícara de café me trouxe, neste momento de contemplação silenciosa, em meio aos estalos da geladeira e nenhum ruído lá fora. Estas palavras são a respeito da minha incapacidade nata de decepcionar multidões e a mim mesmo, são a respeito de enxergar que sonhos são apenas sonhos, que de vez em quando – raramente – tornam-se frutos, mas que ainda assim são sonhos, sobretudo os meus, dos quais você pertencia, dos quais você o era. Estas palavras fazem minhas conclusões pessimistas tomarem um só rumo: eu não fui feito para isso, meu amor, não fui feito para construir nosso futuro, nem quando eu costumava ser otimista, nem hoje quando costumo ser... Indiferente. A empolgação morreu, as perspectivas sanaram, e ainda assim eu continuo falhando e fracassando, em cada decisão, em cada meta realizada, em cada coisinha boba que penso “agora vai”, mas nunca realmente vai a algum lugar, nunca termina, nunca de fato se consuma. É por isso que eu não daria certo com você, é por isso que esta xícara de café na madrugada me trouxe aqui: talvez tenha sido bom como tudo acabou sendo, eu cagando em nossas vidas antes que a cagada se tornasse uma diarreia sentimental e romântica. Viu? Sorte a sua. Sorte a sua eu ser bom em uma única coisa, que é falhar.

20 de maio de 2014

Notas sobre senhoras e parceiros



A diferença, meu parceiro, é que ela ainda te ama. A diferença, a pequena diferença que distingue nossos dois mundos, é que ela ainda espera uma grande atitude sua em relação ao retorno, em relação à sua própria correção perante os erros cometidos, perante as merdas que você fez. E olhe que fizemos, ambos, merdas sem precedentes, mas quanto a isso pode ficar tranquilo, porque ela sempre te amou a esse nível: sempre soube que suas merdas eram sempre em função dela, eram sempre por estar fugindo do passado para alcançá-la, eram sempre pra tentar provar algo – que, convenhamos, você não precisava provar, porque seu eventual ato de respirar já era inteiramente designado àquela mulher. Ora, vamos, parceiro, admita: sempre houve uma esperança para você com a sua senhora, diferente de mim com a “minha”. Ah, e para efeito de explicação, que fique claro que não converso aqui com minha própria consciência ou com o meu lado bondoso, converso aqui com um bom camarada, um bom amigo que deveria ler isso e seguir meu conselho. E qual seria? Relaxe e continue a viver, porque ela irá voltar. Fim de papo. E eu fico feliz em saber que nesses longos sete, oito, nove, quiçá dez anos de jornada, vocês ainda são um do outro, pertencem somente a si mesmos apesar de todas as idas e vindas. Vocês dois são um bom casal, camarada, saiba disso. Saiba que ela ama o trapo que você é, ela ama o falho, porém bom homem que você sempre foi, voltado à ela e somente ela.
Já comigo? Ah, amigo, comigo o buraco sempre foi mais embaixo, abaixo das sombras dos pés, abaixo da sombra das sombras. Comigo o negócio sempre foi e para sempre será complicado, porque por mais que na minha cabeça eu tenha sido exatamente igual a você, por mais que talvez um dia ela tenha gerado um mínimo de afeto naquele peito de seios pequenos e lindos e de coração bondoso e introspectivo, não foi suficiente para encobrir rastros de merdas mal construídas e atitudes não feitas. A diferença entre nós, além, claro, do fato de você ter sorte e eu não, é que a minha senhora não estará disposta a voltar como a sua sempre esteve. A sua senhora, amigão, ainda tem a honra e preocupação de esquentar a cabeça com suas cagadas, mesmo hoje, mesmo depois de tanto tempo. Ela se preocupa porque ainda teme perder algo pelo qual planeja ganhar e conquistar, ainda existe algo pelo qual lutar - essa é a outra diferença. Jamais deseje que sua senhora o mostre uma música cujo refrão diz que “agora você é só alguém que eu costumava conhecer”, porque dói, parceiro, dói pra caralho.
E olha, já para aproveitar esse momento de confissão pública, porém diretamente particular, quero ressaltar que não sou um idiota que finge nunca ter errado, muito pelo contrário. As consequências foram consequências dos meus próprios atos, ou, se assim ela preferir corrigir, consequências da falta dos meus atos. É, que se encerre assim: que o mundo inteiro fique sabendo que a culpa foi e sempre será somente minha, eu pequei por esconder o que sentia, eu pequei por agir estranhamente o tempo inteiro, eu pequei por parecer misterioso e enigmático, quando na verdade por dentro não passava de um menininho eternamente apaixonado – e que ainda não superou isso. É, amigão. O que nos difere é isso: você ser um bom idiota e ter uma mulher que ainda está disposta a ficar contigo; e eu, por ter sido um péssimo idiota com uma mulher que há anos me superou e soube viver a própria vida, sutilmente me dispensando com uma indireta e uma letra – “e eu sequer preciso do seu amor”.
Por isso vá lá, parceiro, termine sua jornada e fique com sua senhora. Um brinde a nós e à nossa amizade, um brinde às mulheres que amamos, um brinde aos finais felizes. E um brinde a mim, é claro, e a todo o peso e à dor que a culpa pode trazer.
Tin-tin.


11 de maio de 2014

Santo Jesus



Maldito seja, ou, nesse caso, bendito seja. Jesus esperto, sabe? Que lugar bom de se estar, queria eu ser ele por uma fração de segundos. Aquilo era a pura danação, tentação completa, uma heresia linda de se ver - diga-se de passagem. Era o modo como aquele crucifixo encaixava, perfeito e promíscuo; era o modo como ele deitava sobre a pele dela e a abençoava por um dia inteiro; era o modo como a protegia com santidade, ou talvez o modo como descansava, zeloso, perto, tão perto do coração dela. Oh, que coisa linda. E por coração, quero que o mundo veja minha ambiguidade na ponta da língua, quero eu que ela também saiba disso. Maldito seja, cara esperto, ficando no melhor lugar para se estar, o que inevitavelmente me faz enxergar aquela fervente poesia em forma de mulher completamente despida, com o Jesus pendendo em seu pescoço, de braços abertos para receber a hóstia sagrada da carne, do sangue, do suor e de outros fluidos corporais. Eu a imagino com os cabelos soltos, lisos, curvados pelos ombros, caindo pelos braços e roçando com suas pontas os rosados mamilos, enquanto o abençoado filho de Deus paira entre seus seios, como o faz durante o dia, escondendo-se em meio ao decote casual, em meio à cânone inocência dos peitos modestos, redondos e chamativos, atraindo para um poço vil e sedento de magistrada luxúria, tão silenciosos e deleitosos, para a mácula de qualquer homem em insanidade.
É, maldito seja, Santo Jesus.