20 de maio de 2013

Observador




Percebo que ser de poucas palavras, lá fora, me permite uma coisa que vim moldando com o tempo. É que todo escritor ou aspirante a escritor precisa, além de amar a leitura e a escrita, sobretudo, saber observar as coisas a sua volta. Isto é imprescindível para uma boa carreira profissional ou pessoal. Desde jovem carrego isso comigo, entre as observações de minha mãe e de outras mulheres da família. Aliás, mulheres são criaturas interessantes e se aprendi alguma coisa com elas, foi observar e desenvolver conversas entre olhares. De lá pra cá, adaptei, enquadrei e encaixei meu tipo de análise. Pois lá fora, longe destes textos, destes livros e deste blog, eu pouco falo, podendo soar até insensível. Observo, porque é da minha natureza calar a boca e observar, tecer pensamentos e análises – porém nunca definitivas demais ou vagas demais. Aprendi, observando as pessoas, que elas são muito mais do que aparentam na imagem, porque eu tento enxergar além, em cada dia de convívio, cada movimento. Pois o corpo não engana o que as palavras tentam esconder. As emoções ainda são as mesmas, seja lá quão distintas sejam estas pessoas. Aprendi a observar além, ver a tonalidade de cada olhar e a beleza – da “gordinha” antissocial sentada no canto, por exemplo. Graças a Deus, por ser feio e renegado, aprendi a dar valor nas coisas que realmente valem a pena. Agradeço por não ter nascido externamente lindo e encantador, pois aí as chances de ser hipócrita e narcisista não me deixariam, talvez, alcançar as conclusões que tenho hoje.
Até acho que, por ser um aspirante a escritor ou um modesto observador, tenho aquilo que muitos já ouviram falar, mas são poucos os que realmente entendem. É o que geralmente chamamos de “visão poética”, mas isso já é coisa para outro texto...

17 de maio de 2013

Não é frustrante?




Não é frustrante?
Olhar para o céu e pensar que não somos absolutamente nada comparados à imensidão do Universo?
Saber que nossas atitudes, daqui a dois séculos, não terão a mínima importância ou não farão a mínima diferença? Não é frustrante saber que você levanta, todo santo dia, estuda, trabalha, move mais uma válvula do sistema para não ter uma grande e merecida recompensa? Que enquanto você grita e se move, nos confins do Universo, neste exato ato e momento, não há sequer um eco da sua voz retumbando? Não é frustrante? Não é frustrante saber que um anônimo desconhecido, talvez um século atrás, tinha o mesmo pensamento de mudança que você, tinha os mesmos pensamentos sobre amor, vida, destino, propósito e existência? E que esse mesmo "anônimo desconhecido", hoje sequer é lembrado, tornou-se apenas mais um elemento decomposto embaixo da terra. Porque ele (ou ela) planejou mudanças, traçou planos de revoluções e... Nada. Apenas mais um mínimo parafuso compondo uma grandiosa máquina destinada à ferrugem, oxidação, decomposição, apodrecimento. Uma grandiosa máquina chamada vida - que em milhares de anos (e eu me refiro a dezenas e dezenas deles) não terá sequer uma evidência de que existiu. Não é frustrante? Frustrante olhar para o céu, tentar ser feliz, tentar fazer valer a pena, fazer a diferença, traçar metas, planejar uma vida - apenas construir uma boa vida -, mas, de repente, ter outro rumo (o de muitos) e num piscar de olhos notar que trinta anos se foram, estar dando aula para uma porrada de jovens desinteressados, obter um salário ridículo no fim do mês, alimentar uma penca de filhos palermas e ter uma esposa interesseira e materialista. Ou nem sequer ter “tudo” isso. Não é frustrante perceber-se falho ou literalmente efêmero? Não é frustrante acordar e saber que nada disso terá valido a pena em um milhão de anos? Que alguém, em 1800 e bolinha, também pensava da mesma forma e hoje nem tem seu nome lembrado? Não é frustrante? Saber que alguém na guerra santa teve seu coração atravessado por uma lança, sonhando ter o nome lembrado pelos séculos, mas que o destino foi apenas mais uma fogueira entre milhares de companheiros com o mesmo sonho. Não é frustrante se encher de orgulho por pertencer a uma espécie que está no topo, mas sequer perceber que está limitada a uma esfera mutável que gira numa reles galáxia pertencente a um universo dentro de outro, pairando em outro, mergulhado em outro, dentro de outro, e outro, e outro... Não é frustrante saber que não somos nada, nessa imensurável imensidão indescritível e inexplicável?
Não é frustrante? 

15 de maio de 2013

Tuas costas




Outra vez desbravo estas palavras, caminho através destas repetidas oscilações imaginárias. Outras venho aqui, de novo e de novo. Tuas costas, mas não tuas, e sim as de outra, que sempre serão costas, onde quer que eu vá, onde quer que eu deite, sente, durma ou beije. Beije. Beijo. Beijar. Agora me perco nestes devaneios, sentada na cama: talvez a tua, talvez a minha, talvez aleatória, talvez nenhuma, ou nos meus sonhos – é, provavelmente isso. Mas ainda são costas, as tuas, em específico. Na cama, sentada e nua, com meus lábios se aventurando por esta esbelta e frágil pele, com imperfeitas perfeições. Então eu beijo, numa acalorada manhã ou amena tarde, beijo tuas costas com imenso apreço, quase numa paixão adolescente – boba e ingênua -, quase uma derradeira obsessão. Quase. Não é paixão, longe disso! É puramente atração, admiração, vislumbre e devoção. Costas lindas, límpidas entre as falhas, lisas, claras. Lindas, onde me perco no desejo, me perco e me perco. Tuas costas.

12 de maio de 2013

Um Beijo no Bar


Aquela noite estava sendo um porre, e não no bom sentido. O delegado no distrito policial, meu chefe, estava novamente me perturbando a paciência devido a alguns problemas na comunicação entre os setores e como eu era novo ali, delegado adjunto e coisas do tipo, resolveu me fazer perder alguns anos de vida, e conseguiu. E exatamente por estes anos de vida perdidos ouvindo um velho resmungão, provavelmente corno e que vive comendo a escrivã e acha que ninguém está vendo, decidi perder mais alguns anos destruindo meu fígado com álcool. No entanto a risada escandalosa da garota charmosa sentada na direção oposta a mim não me deixa prestar atenção na dose de tequila em minhas mãos.
Não sei o que foi exatamente o que me fez levantar do meu lugar e ir até o outro lado; mas os olhos castanhos dela acompanharam o caminho inteiro desde que decidi me levantar do banco. Rapidamente prestei atenção no grupo que estava com a mesma, e já sabia que a grande quantidade de bebida que os rapazes estavam pagando para as moças, não eram de todo um altruísmo caridoso e benevolente.
Andei como se fosse ir em direção a porta de trás, que dava para uma viela onde estavam estacionadas as motos, como também as lixeiras daquele estabelecimento "famoso" entre a população noturna da cidade, mas no ultimo momento me dirigi ao bar e sentei ao lado dela. Meus ouvidos atentando para a movimentação logo atrás de mim. Havia entrado no "território de caça" daquele grupo, e eles não gostaram daquilo.
Ignorei-os e prossegui com a minha investida.
— Eles realmente acham que vão arrastar você?
Ela sorriu de canto, e sem olhar para ele respondeu.
— E presumo que é você que vai me arrastar daqui?
Ela abriu um sorriso, só havia um deus que adorava loucura e vinho, Dionísio.
 — Bom… - ela saboreou o gosto da bebida, aspirou o aroma da mesma antes de me responder, os lábios já avermelhados devido o álcool – se você me explicar o que você faz aqui, eu explico o por que de eu estar aqui, feito?
— Feito – respondi com um sorriso aproveitando para apertar sua mão. Ela me guiou para o banco a seu lado, notei que firula excessiva era de propósito. A mesma queria o circo pegando fogo, e os dois machos atrás dela pareciam bem propícios a oferecem o sangue para o ritual que ao que parecia, ela me escolhera como mestre de cerimônia.
Não demorou muito e um deles veio na minha direção, os passos pesados de alguém levemente alcoolizado eram audíveis mesmo com a musica ambiente do local, uma balada bastante melodiosa e agradável.
— Ei! – ele colocou a mão em meu ombro e rapidamente olhei para ela, que me respondeu com um meio sorriso malicioso, era um desafio, se ela queria que eu provasse que era um macho antes de provar ser um homem, que fosse assim, a criatura dentro de mim uivava por libertação – Ela tá comigo!
— Você está com ele? – indaguei aproveitando para colocar as mãos no balcão e ficar com a cabeça na direção do halito dele.
— Nunca vi mais gordo! – retrucou eufórica dando uma piscada e sorrindo maligna, e como num passe de mágica, eu estava liberto! Com uma única cabeçada o fiz cair para trás rugindo de dor, provavelmente com o nariz e alguns dentes quebrados.
— Vamos! – gritei para ela que já estava correndo junto a mim em direção a porta dos fundos, o grupo atordoado vindo logo atrás de nós uivando por vingança.
Saímos em disparada pela porta traseira, onde minha bela chopper estava nos esperando, consegui ouvir o riso dela quando montei na mesma e dei disparada, saindo zunindo dá viela e entrando de cabeça na noite da cidade. O corpo da mesma já colado ao meu.
— Acelera! – ela gritou em meu ouvido, e já que estava levemente alterado pelo álcool, assim o fiz, preferindo enfiar a moto numa estrada que daria nas colinas e de onde poderíamos observar a cidade no vale abaixo.
Seguimos pela estrada por um longo tempo, até passarmos por dentro de um bosque e enfim sairmos nas colinas próximas a cidade. Dalí pra frente eram as fazendas, os sítios e as mansões dos ricaços da cidade. Acabo lembrando que a maioria do políticos da cidade moram por ali.
Chegamos ao topo da colina e estaciono a moto, girando a chave da ignição desligando o motor. Abaixo o descanso e só então noto que minha companhia está muito quieta. No entanto percebo que ela não está dormindo.
— Qual seu nome? – decido quebrar o gelo, afinal, nem o nome dela eu sei.
— Começa com D, e termina em anielle – ela retrucou com aquele leve tom engraçado na voz – e o seu, qual é?
— Ricardo – retruco, enquanto ela se ajeita no assento. Os olhos castanhos levemente marejados devidos ao álcool, exaustão e sono, mas percebo algo mais ali que não consigo definir.
— Então, Ricardo…você ainda não me disse o que foi fazer naquele bar.
— Perdendo alguns anos de vida ao ultrapassar o limite entre remédio e veneno devido a estresse no trabalho – ouço-a rir do trocadilho – e você, Danielle?
— Trabalho numa casa noturna – murmurou manhosa – e digamos que se trocasse a palavra trabalho por escravidão seria mais justo.
Ri de volta sentindo o corpo dela aconchegar-se ainda mais no meu, o que me levou a perguntar.
— Você está com frio?
— Com frio, com sono, e com vontade de tomar banho – murmurou de volta sem perceber antes de me retrucar – desculpa, não sou muito de desabafar.
— Nem eu, mas como provavelmente não nos veremos novamente acho que é aceitável desabafar com estranhos.
Senti o corpo dela apertar-se um pouco mais contra o meu, enquanto as mãos na minha cintura passavam a investigar meus bolsos. Deixa-a remexer, uma de suas mãos passou bem próxima a minha virilha até ela subirem por dentro da minha jaqueta e ela puxar meu Smartphone do bolso da jaqueta.
— O que vai fazer? – indaguei com certo receio.
Ela se afastou de mim e pude ouvir o som de dois teclados diferentes de celulares sendo digitados, quando olhei por cima do ombro notei que ela era ambidestra, em uma das mãos o meu celular, e na outra o dela.
— Deveria colocar senha no seu celular – sobrancelhas castanhas arquearam-se para mim antes dela me devolver o celular – qualquer um pode ver seus contatos e suas mensagens.
— Se você prestou atenção meus contatos estão em código, e não tenho nenhuma mensagem salva – girei novamente a chave da ignição da moto – vamos sair daqui, daqui a pouco passa a ronda da cidade e não quero ser preso por estar embriagado.
— De fato…
O tom de resignação na voz dela fazia bem evidente a noção que ela também já tinha passado por aquilo, soltei uma risada e rapidamente senti minhas costas esquentarem novamente quando a mesma preparou-se para descida em alta-velocidade colina abaixo. O que dava certo prazer ao saber que não estaria estragando demais os meus pneus novos em folha.
— Gostaria de ir até as docas se não for muito incomodo… - ela murmurou no meu ouvido apoiando o queixo em meu ombro — se não for muito incomodo é claro.
— Nenhum, gosto de ver a baia, principalmente do píer do forte.
Anuiu contra meu ombro antes de deitar a lateral da cabeça contra as minhas costas antes de apertar suas coxas contra meu quadril, dava para senti-la tremer de frio.
— Está frio hoje, cadê sua jaqueta?
— Acho que esqueci lá no bar – comentou sem se importar, antes de aconchegar-se mais um pouco – você é quente, embora calor não seja uma problema na nossa cidade que chega a 30º Celsius de dia.
— 35º você quer dizer, e que chega a 20º graus a noite, o que pra nós é frio pra cacete, mas pro pessoal do sul, é normal – comentei de volta rindo.
— Pelo visto você já foi no sul – os dedos dançando pelas fibras da minha camisa e dedilhando a musculatura do meu abdômen, o risinho que ela soltou deu calafrios em minha espinha.
Ri de volta antes de acelerar ainda mais minha motocicleta, que demorei um bom tempo para comprar. Na verdade boa parte do meu salário como federal.
— Com minha família na infância, passamos alguns dias na casa da minha tia – ri desacelerando um pouco a moto esperando que ao chegar no sinal vermelho ele se torne verde, e quando isso acontece acelero novamente – um frio danado para um certo garoto magrinho que além de tudo, pegou catapora.

Sua risada cortou o ar, o passando pela sua garganta vibrando suas costelas e então vibrando as minhas.
— Você ri por que não foi com você – retruquei com um tom humorístico na voz acelerando ainda mais, estávamos a uns 80 km/h e em segundos já estávamos em alta velocidade, já sabendo que a resposta dela seria rir loucamente.
Descemos a pista em alta velocidade, e eu tinha uma leve pressentimento que infringir leis de transito mesmo sendo um agente publico, não seria a única coisa realmente ruim que me aconteceria ao estar com ela.
E sinceramente, como eu odeio estar certo.


(Malévolo)

~

Abri meu email e lá estava isso, autor desconhecido com pseudônimo maneiro. Só postei porque curti a história e quero saber o que vai rolar. Parece interessante e tinha um recado dizendo que o título faria sentido depois, CASO eu postasse. Então ta aí, anônimo. Mande mais! E quem é que tenha sido... Revele-se, isso é tenso. '-' 

7 de maio de 2013

Se foi




Fumei outro cigarro da vida.
Fumo porque acalma, fumo por ser idiota, para foder com uma saúde minha que já não é lá das melhores. Fumo porque dói e, a cada trago, sinto um alívio passageiro me aplacar. Fumo não por influências – conheço pessoas na merda que até hoje em vão tentam largar o vício. Fumo porque me ajuda a esquecer, mesmo que por um minuto, que você se foi. O que mais me dói em pensar é que, nessas noites de solidão, nenhuma mulher tem me arrebatado a cabeça como você sempre fez. Como sempre fazia. É isso que dói. É por isso que fumo. A ideia de um fim, aqui dentro, na porra desse coração, era imaginar que um dia isso chegaria, mas estar preparado psicologicamente para o dia não te previne para o dia, me entende? Aí eu fumo. Aí eu faço essas merdas, e que se foda tudo, que se foda este instante. Que se fodam amigos, familiares. Que se fodam conceitos, julgamentos, doutrinas ou regras. Que se fodam os bons modos. Eu fumo, usando essa merda nos meus pulmões para aplacar o lugar que você deveria ocupar na minha caixa torácica, me entende? Fumo pela amargura, fumo por você nunca ter acreditado em uma única mísera palavra que te dediquei, em todos esses míseros anos em que te dediquei toda a minha devoção. Miserável. Mas não te culpo, porque és a parte boa nisso tudo. Há quem diga que te glorifico. Bem, e daí? Glorifico, dê seu voto. Eu apenas fumo!
Embarco numa vida não destruída, mas descompromissada. Você foi o meu molde e só tenho medo de não conseguir encaixar ninguém aqui... Espera, eu jamais encaixaria, a não ser você mesma. Vê? Entende? Tem dimensão do tamanho dos destroços que virei? Pequeno por fora, gigantemente cagado por dentro. Aí eu fumo, e continuo escrevendo textos, textos e mais textos que, acredito, jamais serão lidos ou devidamente interpretados. Dedico um texto de vários parágrafos, porque nem isso, aqui no blog, sou acostumado a fazer. Quanto mais parágrafos pra ti, maior a dedicatória, acredite.
Fumo. Que se foda. Apenas fumo porque você não está mais aqui das maneiras que deveria estar. Fumo porque você foi levada de mim, por erros que o mundo nos aplicou com distâncias, impressões equivocadas, textos mal interpretados, por novos amores com futuros utópicos que te soaram promissores e, sobretudo, por erros que eu cometi e não fui capaz de corrigir. Você é a parte boa nisso, e não há como eu não me culpar por ter estragado cada segundo (ou talvez eu não o tenha feito, do mesmo modo como sou incrivelmente cego diante da tua existência – daí a razão de te glorificar, certo?). Fumo porque, sinto, te perdi – talvez desde o início.

Minhas manhãs




Sobre o que é esse texto eu exatamente não sei. Talvez sobre mim, talvez sobre as manhãs de Belém. Talvez sobre um quarto quente e abafado como a maioria dessa cidade, sobre não ter perspectiva, dormir muito e não ter, tecnicamente, um compromisso com as aulas de cursinho e uma vaga na universidade. É sobre definhar enquanto você vê, com o nascer de mais um dia quente, sua carreira escorrendo pela calha aquecida. Digo, eu poderia estar na UFPA, mas disso já cansei de reclamar e aqui não vou redigir mais reclames. Eu abandonei, virei a página, estou tentando de novo, ótimo. Mas ainda durmo. Mas ainda durmo a hora que quero e, consequentemente, não acordo na manhã seguinte no horário para encarar mais uma rotina de aulas massacrantes do pré-vestibular. Há quem não me entenda, mas isso já é rotina. Falo aqui também sobre o clima de Belém, falo sobre como é acordar 12h, com os pés gritando de dor (porque geralmente é isso o que acontece quando você tem neuropatia diabética e dorme além da conta ou simplesmente dorme). Não bastando a dor, está quente, um calor dos infernos, uma preguiça diabólica e uma pré-disposição a morrer e passar o resto do dia com dor e vontade para nada. Só me pergunto quando instalarão a pequena central de ar nesse quarto, “simbora”, pai! Gostaria de morar em uma região amena, pelo menos nas minhas condições. Aí acordar tarde não seria um fardo – talvez o ato de dormir não seria um fardo – e finalmente eu entenderia as fotografias lindas que mostram pessoas felizes deitadas o dia inteiro, sem vontade de sair da cama ou... Espera. Elimino o calor, mas não elimino a doença. Ainda assim eu sentiria dor, e esses últimos cinco ou oito meses não me têm sido fáceis. Quando durmo (seja pela noite, manhã ou tarde) e acordo, sinto dor. Se como uma colher a mais de qualquer coisa, sinto dor; se fico em pé por cinco minutos, sinto dor; se ando de sandálias fora de casa ou passo muito tempo de sapato... Sinto dor. E quem me dera (apenas um aviso aos críticos) essa dor fosse como qualquer outra. Só tento dizer que não é tão simples quando seus nervos não funcionam e estão afetados para o resto de sua vida. É. Como eu desejaria ter saúde e uma Belém mais fria. Aliás, amo minha cidade, só não gosto do clima.
Talvez a vida fosse um pouco menos maçante. É, vai saber. 

3 de maio de 2013

Da metalinguagem ao abismo




Certa vez pensei em escrever um texto, cujo título seria “guerreiro”. Nele, eu descrevia todas as fortes razões para um homem voltar para casa, ao fim do dia ou da jornada, para a mulher amada. Eu descrevia, fibra por fibra, a imensa alegria de um homem ao ouvir um “eu amo você” da mulher apreciada, e o quanto isso o revigora de maneiras indescritíveis. No texto, eu dizia que ele enfrentaria todas as mais vis e sólidas barreiras para alcançar o caminho de volta e, ao fim da aventura, repousaria entre os seios da amada, o calor de seu corpo e delírio entre as pernas. Pensei em escrever esse texto em um ano que embora não esteja longe, me parece a lembrança implantada de outra vida. Mas eu nunca o escrevi, nunca coloquei em prática a ideia, não por preguiça, mas por um motivo que me soou estranhamente íntegro na época: se descrevesse o que sentia, se descrevesse mais uma vez, então compartilharia com o mundo algo que deveria ser mantido aqui, em segredo, distante do conhecimento de pessoas que nada tinham a ver com tais palavras. Soaria como uma motivação indigna; pareceria, no fim das contas, que o guerreiro em questão só desejava ser amado para ter forças e vencer batalhas, ou que o poeta só desejava ser amado para ter inspirações para escrever mais. Aos olhos do mundo, soaria exatamente assim. Mas não o é, e por isso jamais esse texto escrevi. Não pelo medo do mundo me julgar, mas pelo terror de você me interpretar erroneamente – coisa que, cá entre nós, parece ser uma terrível tendência sua. Não escrevi, guardando assim uma das razões por eu ter feito um milhão de coisas que fiz. O problema, ah, o problema, é que a motivação sumiu, desapareceu. Esse falho guerreiro não tem vontade para desbravar o que um dia desbravou, porque não há mais uma donzela esperando-o no lar com os braços abertos e sorriso no rosto. Por razões múltiplas, a donzela cansou de esperar, cuspiu e partiu com outro guerreiro ou talvez por si própria – porque mulheres vivem sem homens, mas o contrário não. Na batalha, só restou um inútil garoto com a espada na mão em meio à guerra. Isso não é para soar dramático, é apenas um pequeno e leve lembrete de que, às vezes, a atitude mais sábia está justamente em não sair de casa e em não ir à guerra.
É de suma importância que se fique. Ou o guerreiro conhecerá o abismo.

1 de maio de 2013

Mentiras que ela conta




Eis meu momento de desabafo – mais um entre tantos –, não de tristeza ou desolação, mas simplesmente desabafo. Sei agora a mentira que ela contou, ou, basicamente, conta. Sei que foi para me proteger, ela o fez da mesma forma que eu faria se estivesse em seu lugar. “É claro que importa, Felipe. Mas não posso dizer isso. Não a você”. Esta é a verdade que me ressoa na imaginação, construída e verbalizada ao som de sua voz. É nesse momento que eu solto um longo suspiro e me digo: agora fodeu! Porque, cá entre nós, eu sempre soube que estava tudo fodido, ou talvez predestinado a estar desde o instante que fui concebido. Ainda não entendo essas cartadas do destino, tampouco as cartadas do acaso ou da vontade divina, se existir um Deus. O fato é que uma mentira, nesse caso, até me soou como alívio, pelo menos até o instante em que descobri a verdadeira verdade. Isso não me faz repudia-la, muito pelo contrário. Me faz amá-la mais por ter sido cautelosa comigo em algo que realmente – me faz ou – me deixaria pior. As coisas não mudam, tampouco as mentiras convertem-se em verdades. Verdades.rar, Verdades.mp3, Verdades.doc. Eu estive perdido por tanto tempo que a ideia de “perdição” já me é algo imensamente vívido, real e normal, porque é uma realidade da qual já estou conformado. A vida é repleta dessas ironias, principalmente comigo, sobretudo quando o assunto não se trata de amor ou desilusões amorosas (coisa que esse texto absolutamente nada tem, que fique claro). No fim, acredito que tenha sido uma mentira louvável, uma mentira que perdoo e que finjo acreditar, hoje, quando ela volta a dizê-la para me fazer sentir bem numa falsa percepção de “você não precisa se importar com isso, Felipe”. Sinto muito, mas eu me importo, preciso e tenho que me importar sendo o que sou. Mas continue mentindo, vejo este ato similar àquele que fazemos com as crianças, ao fantasiarmos a visita do Papai Noel durante a noite. Isso mostra o quanto você é boa, embora não alivie minhas mágoas e decepções para comigo mesmo. Continuo me julgando o fracasso secular, porque é o que sou em cada detalhe do meu ser – tanto o interno quanto, principalmente, o externo.